‘Valorizar o biológico e artesanal’, esta é a história de uma empresa que preserva o solo, o meio ambiente e a biodiversidade.
A Vale de Alfaia é uma empresa agropecuária localizada na Beira Baixa, que desenvolve a sua atividade assente numa agricultura que recorre a técnicas que garantem sustentabilidade, preservando o solo, o meio ambiente e a biodiversidade. Amália Veríssimo é gerente da empresa e respondeu desta forma às nossas questões:
Quem são as pessoas por detrás da empresa?
Esta é uma empresa com muitos anos, que era dos meus sogros. Atualmente eu e o meu marido estamos à frente desta exploração agrícola onde temos animais e fazemos produção de leguminosas e de azeite. Paralelamente à criação dos animais temos uma queijaria, que também já tem muitos anos e que foi remodelada, onde utilizamos o leite proveniente dos nossos animais.
Que desafios enfrentam no dia-a-dia?
Um dos grandes desafios é fazer agricultura biológica, sem pesticidas e o único fertilizante que vamos utilizando é o composto orgânico da própria exploração. Não utilizamos nada para combater pragas e infestantes, não usamos regas, e isso é logo à partida o primeiro grande desafio. Fazer agricultura com regas onde podemos contrariar o clima torna muito mais fácil aumentar a produção. Sendo que não fazemos nada disso, a nossa produção é mais reduzida, mas o produto também é muito melhor. Por vezes o aspeto pode não ser tão bonito, mas é melhor sem dúvida alguma.
Também temos um olival, e para obter um azeite de qualidade, quando vêm chuvas fora de hora e aparecem as infestantes nas oliveiras, não podemos colocar nada e isso torna o processo muito mais trabalhoso. Um outro desafio que enfrentamos são as mudanças climáticas, o clima não era assim antigamente, nós hoje não conseguimos prever minimamente o clima.
Outro desafio, não menos trabalhoso, é explicar isto tudo ao consumidor final. Explicar-lhe que estes produtos não têm de ter um preço exorbitante, mas têm de ter mais qualquer coisinha porque têm de ser mais valorizados…, mas vale a pena, porque o consumidor está a consumir um produto que é de facto melhor. Mas o desafio mais atual foi provocado pela pandemia e por toda esta situação de as pessoas não se deslocarem e portanto não podermos fazer feiras como fazíamos antigamente, não podermos ter contacto direto com o cliente como há dois anos. Nós começávamos a campanha em outubro e sabíamos que em Julho e Agosto tínhamos a produção toda vendida, em mercados, feiras, atividades e eventos. Hoje não há nada e é o desafio mais recente que ainda estamos a tentar ultrapassar, tentando criar outras formas de chegar ao cliente, porque este produto é um pouco difícil de colocar em lojas online sem uma boa explicação.
O nosso queijo tem um fabrico completamente artesanal e não leva nenhum produto para não apanhar bolor e nenhum produto na casca. No nosso queijo apenas está leite, uma pitadinha de sal e umas milésimas de gramas de coalho. Evidentemente isto faz com que este queijo tenha um aspeto mais rústico, que no Verão seja mais rijo e no Inverno de pasta mole, e por isso mesmo há toda uma explicação que gostamos de fazer ao cliente, que também gosta de provar.
O consumidor português valoriza os produtos regionais e o modo de produção biológico?
Na minha opinião é mais uma questão de modas, o consumidor gosta muito de dizer que valoriza, mas na hora da compra não acredito que valorize assim tanto. Está na moda dizer que consumir português é bom e eu gostaria mais que deixasse de estar na moda e começasse mesmo a ser uma realidade. Para além disso, o consumidor também gosta muito de comer com os olhos e eu como consumidora também faço isso, e portanto, esforço-me para ter o meu produto sempre muito bem apresentado. Contudo eu acho que muitas vezes as pessoas olham mais para outros aspetos do produto que na minha opinião são mais supérfluos como a embalagem e esquecem-se que o que está lá dentro é que conta e quando dão por eles estão a pagar mais por outras coisas do que pela qualidade do produto em si, ou seja, o que consumiram é 20 % daquilo que estão a pagar, o resto é marketing, imagem, embalagem, etc.
O consumidor por vezes gosta muito de referir a importância de consumir português e biológico, mas na hora da compra vacila. Muitas vezes o problema é que o produto biológico vem para o mercado com preços muito altos, e isso está errado, criou-se a ideia de que tem de se pagar muito para consumir biológico, e não é bem assim. Claro que o consumidor também tem de entender que tem de pagar mais qualquer coisinha quando está a adquirir um produto biológico, pois há todo um esforço inerente à agricultura biológica intrínseco ao produto. Portanto, é claro que tem de pagar-se mais qualquer coisa porque o produtor tem de ser ajudado, pois não é fácil produzir em modo biológico, mas eu estou segura de que é o caminho mais certo, temos de lutar para seguir este caminho porque se não formos por uma agricultura muito mais sustentável as coisas não vão correr bem.
Acredita que os produtos tradicionais portugueses e a produção local são instrumentos importantes para a valorização dos territórios de origem?
Eu para além de acreditar, estou segura de que só assim fará sentido. Os nossos políticos devem começar a pensar mais nisso, tentando encontrar formas de valorizar mais o que é tradicional e nacional, ajudando-nos da melhor forma e quando eu digo ajudar, refiro-me a uma ajuda logística, a uma ajuda de incentivo à mobilização das pessoas, porque se os pequenos e médios produtores deixarem de existir e só ficarem os grandes, não iremos a lado nenhum. Principalmente nas nossas zonas aqui, nem me refiro tanto às grandes cidades. Mas nós aqui precisamos muito dessa valorização porque há muito pequeno produtor num tecido tão grande, que se as pessoas e as nossas entidades refletissem mais sobre ajudar os pequenos produtores, a economia nacional seria muito mais valorizada.
Numa era marcada pela industrialização, algumas das técnicas ancestrais de produção e cura vão-se perdendo no tempo e nas gerações seguintes. Que tipo de iniciativas promovem para que não se perca a tradição junto dos mais jovens?
Nós o que temos feito é explicarmos as pessoas a forma como trabalhamos, como curamos e tratamos o nosso produto. Quando vem um cliente novo tentamos sempre mostrar-lhe o que está por detrás do produto, o inteiro processo e matéria-prima: tentamos mostrar-lhe a queijaria, os animais, a forma como se fazem as coisas e, portanto, organizamos também algumas visitas guiadas para que as pessoas percebam o nosso esforço em manter a qualidade e a tradição.
Como asseguram a qualidade dos queijos e dos azeites?
Como trabalhamos em modo de produção biológico, nós respeitamos sempre o ciclo animal e só produzimos queijo entre outubro e maio, mais ou menos, que é quando as ovelhas dão leite porque estão prenhas e os partos vão começar em finais de agosto/princípios de setembro. Os borregos são vendidos em outubro, e depois têm o seu período de aleitamento até março/abril, por vezes maio. As ovelhas também irão ter alguns borregos em janeiro e fevereiro, e é o ciclo natural delas que para nós é uma prioridade cumprir. Para nós é fundamental não estarmos a influenciar os partos dos animais, para cumprirmos com a nossa intenção de fazer uma agricultura sustentável, portanto no que diz respeito aos animais, não alteramos o ciclo deles.
Na parte das culturas fazemos idêntico, a filosofia é a mesma: apenas cultivamos produtos que sejam endógenos e que possam funcionar bem com o clima natural que nós aqui temos, ou seja, só fazemos cereais de sequeiro, não fazemos regadios para não estarmos a usar regas e para não estarmos a forçar a cultura. No que diz respeito à queijaria, trabalhamos apenas com o nosso leite, em pleno Inverno produzimos queijo fresco, requeijão, e queijo curado. O nosso queijo curado é em cura natural, mediante o clima que tivermos na altura, não temos câmaras frigoríficas e, portanto, o queijo não sofre uma cura com câmaras frigoríficas ou seja, nós não controlamos a humidade nem a temperatura. Quando fazemos o queijo no Inverno ele é ótimo porque o queijo para ser bom tem que ter muita humidade e muito frio, por isso é que nós começamos a produzir em novembro e em finais de abril, inícios de maio, paramos. Isto porque como nós não temos frio, o queijo já ‘sora’ muito rapidamente e já não é um queijo de tão boa qualidade. O queijo fresco também é feito nessa altura e nós até dizemos que o queijo fresco só se consome no inverno com o frio, no verão não há queijo fresco, até porque não temos produção de leite nessa altura.
A nossa queijaria e a nossa exploração estão certificadas em modo de produção biológico, pois cumprimos os requisitos necessários para podermos ter essas certificações e tentamos produzir tudo dentro de parâmetros que são os mais respeitosos e naturais possíveis, que nos deem um produto de qualidade. Com o azeite é igual, fazemos em modo de produção biológica em lagares com garantia em produção biológica. Quando achamos que o mercado não está preparado e não vai valorizar essa certificação então fazemos num lagar certificado convencional.
A Vale de Alfaia no SmartFarmer
O queijo curado de ovelha BIO, é o resultado de uma agricultura que respeita o meio ambiente e a biodiversidade. Na Vale de Alfaia, Amália Veríssimo e o seu marido esforçam-se para produzir dentro de parâmetros que são os mais respeitosos e naturais possíveis, acreditando na origem dos ingredientes e na tradição. Este produtor integra a nossa plataforma e este produto está disponível aqui: https://smartfarmer.pt/produto/queijo-curado-ovelha-bio/